Marco
Pigossi é um ator versátil. Nem seu "physique du rôle"
com um rosto de traços finos e porte de galã o limitou a
personagens com perfil de bom moço. Tanto que, até interpretar o
Bento de Sangue bom, o primeiro protagonista de sua carreira, deu
vida a tipos bem variados entre si. Como o gay espalhafatoso Cássio,
de Caras & Bocas, o vilão Rafael, de Fina estampa, e o tímido
Juvenal, de Gabriela. "Era tudo o que eu queria, me ver como um
ator que pudesse fazer comédia, drama, brincar com vários
personagens diferentes", vibra.
O
que também ajudou Marco nessa variedade de papéis foi a
caracterização: completamente distinta em cada novela. Por isso,
volta e meia, ele percebe que as pessoas não o associam a todos os
personagens que interpretou na tevê. Inclusive, durante uma gravação
de Sangue bom, no Hopi Hari, parque de diversões em São Paulo, com
Sophie Charlotte, que vive a Amora na trama, ele não foi
reconhecido. "Duas meninas estavam conversando e uma falou para
a outra: nossa, eu adoro essa atriz, assisto a todas as novelas dela.
Ele, eu nunca vi", relembra, aos risos, o ator, que fez o par
romântico de Sophie em Fina estampa, último folhetim em que ela
atuou.
P
- Em Gabriela, seu trabalho anterior, você interpretou um bom moço,
o Juvenal. E agora também vive um rapaz do bem em Sangue bom. O que
mais atraiu você em relação ao Bento?
R
- O Juvenal era um personagem do bem, mas era muito diferente do
Bento. Era mais melancólico e muito tímido. São várias coisas que
me chamam atenção nesse papel. Primeiro, porque a Maria Adelaide
(Amaral, autora) tem uma construção em cima desse mocinho que foge
completamente do comum do mocinho em novela, o que é muito
interessante. Não é o mocinho que sofre, que espera as coisas
acontecerem com ele. Não. O Bento é ativo no jogo, tem um senso
coletivo forte. Tem uma amiga com quem sai e dorme junto quando está
afim. Isso é muito interessante porque desconstrói essa coisa do
mocinho, traz para uma coisa mais atual, que realmente existe. É um
mocinho, mas em um outro lugar.
P
- Existia alguma preocupação sua em não cair no estereótipo do
mocinho chato?
R
- Existia um pouco. Mas, quando eu comecei a ler o texto, entendi o
que a Maria Adelaide estava querendo propor ali. Acho que é um jogo
muito conjunto. Não tive de me preocupar com isso, tirar dessa coisa
de mocinho sofredor. O Bento mesmo já é esse cara, ele é um líder,
que comanda aquele bairro e que estruturou a vida daquelas pessoas.
Então, a proposta do personagem já não era desse mocinho sofredor.
P
- Como foi o processo de composição do personagem?
R
- Fiquei três meses em Holambra estudando flores. Desde plantação,
colheita, arranjo, decoração, buquê. Foi importante não só para
que as cenas em que Bento mexe nas flores fiquem boas, mas para
entender o personagem. Porque o Bento tem um tempo diferente, não
tem a velocidade de informação que a gente tem hoje em dia. Ele
espera três meses para um botão de uma flor começar a brotar. Hoje
em dia, queremos tudo na hora. Foi muito interessante entender o
tempo do personagem. A partir daí, fui construindo.
P
- E foi atrás de outras referências?
R
- Fui pegando referências no texto, li o livro O menino do dedo
verde, de Maurice Druon, e outros romances. Vi o filme Conversas com
meu jardineiro, em que um pintor famoso encontra um jardineiro e
descobre que eles são amigos de infância. Peguei algumas
referências minhas também, como o que eu tinha de mais sincero para
colocar no personagem. O Bento é muito sincero, honesto e simples
nas emoções. Então, tive de pegar o que eu tinha de mais sincero
para emprestar para o personagem. É um papel que não tem uma
construção muito forte.
P
- Como assim?
R
- Se for analisar, o Cássio, de Caras & Bocas, tinha um trabalho
de corpo, tinha uma voz, um jeito. O Juvenal era fechado, sempre
olhava para baixo e não nos olhos das pessoas. O Rafa, de Fina
estampa, era mais vilão. O Bento não. Ele é simples nessa
construção, então eu tive que aproximar mesmo de mim. É tudo
muito sutil, sem máscaras.
P
- Em Fina estampa, de 2011, você e Sophie Charlotte fizeram um par
romântico. Foi por causa da boa repercussão daquele casal que
surgiu o convite para vocês voltarem a contracenar em Sangue bom?
R
- Não. Aquilo foi uma coincidência total. Fizemos Ti-Ti-Ti em 2010,
mas eu e Sophie nem nos encontrávamos nessa novela, só gravamos uma
cena juntos. E a Maria Adelaide gostou do nosso trabalho e já
colocou na cabeça que a gente faria uma outra novela dela. Em 2011,
me chamaram para fazer Fina estampa. A princípio, eu não iria
fazer, seria o Rafael Cardoso, que precisou sair de última hora para
entrar em A vida da gente. Então, fizeram teste com cinco atores
contratados. Eu fiz o teste em uma sexta e comecei a gravar na terça.
Foi de última hora, totalmente por acaso. Quando ela viu o casal no
ar em Fina estampa, me contou que pensou em mudar. Mas são situações
completamente diferentes e faz tempo. Aí, a Maria Adelaide decidiu
manter.
P
- Este é o primeiro protagonista de sua carreira na tevê, que
começou com a minissérie Um só coração, de 2004. Como encarou o
fato de encabeçar uma novela?
R
- Acho que essa coisa de protagonista é muito relativa. Às vezes,
há personagens coadjuvantes melhores que os protagonistas e crescem
de uma maneira que acabam virando protagonistas. A função do
protagonista mesmo é contar uma história. Então, você está
sempre ligado com a trama. Essa é a preocupação. Mas não deixa de
ser uma realização também. O Dennis (Carvalho, diretor) e os
autores estão confiando em mim. É um reconhecimento do meu
trabalho. Então, acho que pode dar certo. É um frio na barriga bom.
P
- Como é dividir o posto de protagonista com outros cinco atores
Sophie Charlotte, Jayme Matarazzo, Humberto Carrão, Fernanda
Vasconcellos e Isabelle Drummond? De alguma forma, ameniza a
responsabilidade?
R
- É bom. As pessoas me perguntam muito qual é o peso de fazer um
protagonista. Não é um peso. Tem uma responsabilidade muito grande.
Mas não pelo quanto você vai aparecer, mas por ser responsável por
contar aquela história. O protagonista tem de conduzir a história e
contar de uma maneira que as pessoas gostem, se emocionem e comprem
aquela ideia. Então, dividir com seis é muito bom. E é muito legal
porque todo mundo praticamente começou junto. Vimos cada um
crescendo no seu caminho, fomos acompanhando um ao outro e coincidiu
de chegarmos juntos aqui. E somos jovens, temos muito o que aprender
ainda.
P
- Em sua trajetória na tevê, você tem acumulado personagens
diferentes entre si. É uma busca pessoal ou essa diversidade
aconteceu por acaso?
R
- Os dois. É uma busca, mas foi acontecendo, graças a Deus. Eu falo
que sou muito sortudo. Não sei se é sorte ou o que é eu conseguir
mostrar realmente meu trabalho em diferentes lados. São várias
personalidades, várias personas. E esse é o trabalho do ator. Se
você fica preso, sempre fazendo aquela mesma coisa, fica chato,
perde esse brilho que a gente tem de ter de coisa nova.
P
- E da onde vem essa sua versatilidade cênica?
R
- Do teatro. Eu fiz o Chicó, em O auto da compadecida, ano passado.
No teatro, você tem a possibilidade de fazer algo que nunca vai
fazer na televisão. Por mais que todos os meus personagens tenham
sido diferentes, eu não vou fazer, na tevê, um velho de 80 anos, um
nordestino. É uma questão de perfil. No teatro, tem essa
possibilidade, o que é muito interessante.
P
- Nos últimos anos, você tem feito uma novela seguida de uma peça
de teatro. Aproveita a visibilidade que a tevê proporciona para
atrair mais público para os espetáculos que você faz?
R
- Sim. As pessoas vão levantar do sofá para ir ao teatro assistir
você porque elas gostam de te ver na televisão. E o teatro traz uma
bagagem para você fazer um bom trabalho na tevê. Um completa o
outro. Estou juntando o melhor dos dois mundos.
P
- Justamente por ser um lugar de mais visibilidade, trabalhar na tevê
significa estar sujeito a críticas. Como você lida com elas?
R
- Acho que é uma questão de saber de onde elas vêm. Tem muita
gente que está ali só para aplaudir você à toa, assim como tem
muita gente que está ali só para criticar. É saber da onde vem e
saber dosar isso. Não só as críticas, como os elogios. Alguns
elogios, a gente escuta. Outros, a gente também não precisa dar uma
pirada e acreditar.
Fresco
na memória
Mesmo
depois de quatro anos e mais quatro novelas, Marco Pigossi ainda é
muito lembrado pelo Cássio, de Caras & Bocas. Foi a partir desse
trabalho que o ator ficou conhecido não só do grande público, como
dos diretores e autores. "Foi uma novela que deu muito certo,
tinha uma audiência assustadora, com média de 42 pontos",
exalta.
A
aceitação do personagem foi tão grande, que seu bordão, "rosa
chiclete", virou nome de esmalte e de festa. Na época do teste
para o folhetim, Marco nem imaginava que Cássio fosse ter tanta
repercussão e espaço na trama. Até porque a sinopse era sucinta:
"alegre, divertido, trabalha na galeria". "Se for
comparar o primeiro capítulo com o último, no primeiro, o
personagem era muito mais contido. O Cássio foi enlouquecendo ao
longo da trama, soltando a franga porque deu certo", explica.
Fonte: Jornal Cruzeiro do Sul.
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